Conhecida por sua beleza natural, parques bem cuidados e orlas que convidam a longas caminhadas, Vitória enfrenta um problema que compromete a dignidade e a saúde de moradores e visitantes: a crise dos banheiros públicos. O que deveria ser um serviço básico em uma capital de destaque, se revela uma infraestrutura quase inexistente, forçando a população a recorrer a soluções improvisadas ou, pior, a passar por constrangimentos diários.
Enquanto a cidade se orgulha de suas paisagens, a realidade é que áreas de grande fluxo, como praças, orlas de Camburi e Curva da Jurema, e parques urbanos, contam com pouquíssimos banheiros fixos. Essa carência atinge a todos, mas penaliza de forma cruel os mais vulneráveis: pessoas em situação de rua, trabalhadores informais e idosos. Além deles, outros grupos cruciais para a dinâmica da cidade são prejudicados, como turistas, que buscam pontos de apoio para aproveitar a cidade; estudantes, que se movem constantemente entre os campus universitários e as bibliotecas; e representantes comerciais, que precisam de suporte básico durante suas rotinas de trabalho. A escassez de sanitários públicos é, no fundo, uma questão de inclusão social e saúde pública, mas também de atratividade turística e mobilidade urbana.

O Foco no Paliativo em Vez do Permanente
Uma busca nos portais de transparência da prefeitura revela que a solução temporária é a regra, não a exceção. Os dados mostram um padrão recorrente de contratos para locação de banheiros químicos, utilizados em feiras livres e eventos. Em vez de investir na construção e manutenção de uma rede permanente, o poder público gasta recursos anualmente com aluguéis que atendem apenas a demandas sazonais, não resolvendo o problema cotidiano da cidade.
Essa abordagem se contrasta com iniciativas que não avançaram. Um edital de 2019 que visava atrair empresas privadas para a instalação de banheiros fixos por meio de uma concessão de uso não teve desfecho público conhecido, o que sugere uma falta de continuidade em projetos de longo prazo. A ausência de uma política pública estrutural e de projetos de infraestrutura fixa mostra que a cidade segue o caminho do improviso, perpetuando o problema.
O Falso Custo-Benefício: Por Que a Solução Paliativa Não Compensa
À primeira vista, a locação de banheiros químicos pode parecer mais barata. No entanto, uma análise mais profunda revela o oposto. O dinheiro gasto repetidamente em aluguéis e manutenção temporária poderia ser direcionado para o investimento em estruturas permanentes, que não apenas oferecem mais higiene e conforto, mas também se pagam a longo prazo.
A prova de que isso é possível está em outras capitais brasileiras e do mundo. Cidades como Curitiba investiram em uma rede de banheiros públicos bem distribuída em seus parques. Em São Paulo, parcerias público-privadas permitiram a instalação de sanitários modernos em terminais de ônibus e metrô. O exemplo de Paris e Lisboa, com seus banheiros autolimpantes, mostra que a tecnologia pode ser uma FORTE ALIADA da higiene urbana, com manutenção simplificada e eficiente.
O Caso da Orla de São Pedro: A Modernização que Deixou a Questão de Lado
A orla de São Pedro, por exemplo, é um local de grande investimento. O projeto “Vitória de Frente para o Mar” transformou a paisagem com ciclovias, deques e áreas de lazer. No entanto, mesmo com o investimento milionário, a construção de uma rede abrangente de banheiros públicos não foi destacada como prioridade. Os banheiros fixos na região estão restritos a pontos específicos, como o Centro de Esportes e Lazer Eucalipto, e as reformas em praças. Essa abordagem fragmentada em um projeto de tamanha magnitude é a prova de que a falta de banheiros públicos é mais do que um problema de orçamento: é uma falha de planejamento urbano.
O Caminho para uma Vitória Mais Acessível e Digna
A crise dos banheiros públicos de Vitória pode ser resolvida com planejamento e vontade política. As soluções não são complexas e já são aplicadas com sucesso em outros lugares. Entre as propostas mais viáveis, que unem dignidade e sustentabilidade, estão:
- Instalação de Banheiros Autolimpantes: Estruturas modernas e autossuficientes em pontos estratégicos, como orlas e praças. Elas garantem higiene constante, baixo custo operacional a longo prazo e oferecem mais dignidade aos usuários.
- Adoção de Fontes de Energia e Água Sustentáveis: Para reduzir o custo operacional e o impacto ambiental, os banheiros podem utilizar painéis solares para gerar eletricidade, usada para iluminação e funcionamento das estruturas autolimpantes. A água para descarga e limpeza pode vir de poços artesianos, se as condições locais permitirem, o que diminuiria a dependência da rede pública de abastecimento.
- Parcerias Público-Privadas (PPPs): O poder público pode conceder a operação de sanitários a empresas privadas, que seriam responsáveis pela manutenção em troca de alguma remuneração ou benefício.
- Tecnologia para a Cidadania: A criação de um mapa digital ou aplicativo que indique a localização e o status (se está limpo ou ocupado) dos banheiros públicos disponíveis. Essa ferramenta seria um recurso valioso para turistas e outros visitantes.
- Planejamento Urbano com Visão de Futuro: Tornar obrigatória a inclusão de sanitários em todos os novos projetos de urbanização, como a revitalização de praças e a construção de novos espaços de lazer.
A decisão de investir em uma infraestrutura permanente de banheiros públicos não é apenas um avanço em termos de comodidade, mas um gesto de respeito com a população, de zelo pela saúde coletiva e de compromisso com o futuro da cidade.
Jornalista Lauro Nunes
“As grandes cidades são mais criativas porque têm mais pessoas conectadas!”